Empresas de Gaia denunciam no parlamento chantagem do consórcio do TGV sobre estação

Em causa está uma proposta alternativa para a estação da linha de alta velocidade, cujo contrato de concessão define que será em Santo Ovídio, mas que o consórcio quer construir em Vilar do Paraíso.

Outubro 15, 2025

A Associação das Empresas da Zona Industrial de São Caetano, em Gaia, denunciou hoje no parlamento a “chantagem” que o consórcio AVAN Norte está a fazer nas alterações da estação e traçado da linha de alta velocidade no concelho.

“O senhor deputado do Livre [Jorge Pinto] referiu aqui que havia uma certa chantagem. Nós estamos de acordo. Acaba por haver uma chantagem natural porque, pelo que nos foi explicado pelo consórcio, há uma pressão muito grande de calendário relativo aos fundos europeus”, disse hoje no parlamento Francisco Bastos, presidente executivo da chocolateira Arcádia e porta-voz da associação empresarial.

O gestor falava em audiência na Comissão de Infraestruturas, Mobilidade e Habitação, dizendo que se está “numa posição quase de “ou é esta proposta ou nenhuma” – palavras ditas pelo consórcio” numa reunião tida com a associação, segundo Francisco Bastos.

Em causa está uma proposta alternativa para a estação da linha de alta velocidade, cujo contrato de concessão assinado pelas partes define que será em Santo Ovídio, mas que o consórcio signatário AVAN Norte (Mota-Engil, Teixeira Duarte, Alves Ribeiro, Casais, Conduril e Gabriel Couto) quer construir fora do local previsto – Vilar do Paraíso -, algo que, segundo a associação, pode alterar o traçado e obrigar a expropriações não inicialmente previstas na zona industrial de São Caetano.

Numa apresentação feita hoje aos deputados, o porta-voz citou ainda um parecer da Infraestruturas de Portugal (IP) à instalação da fábrica da sua empresa, a Arcádia, de março de 2024, referindo que o traçado “será concretizado através de um túnel a grande profundidade”, não se prevendo “possível que, na fase seguinte dos estudos (anteprojeto e projeto de execução), este possa vir a implicar com o referido edifício”.

O parecer referia que a construção da fábrica da Arcádia não poderia “vir a comprometer ou interferir com a LAV [linha de alta velocidade], nem é passível de tornar mais difícil e onerosa a construção da mesma”, não parecendo também “verosímil” que o traçado pudesse “vir a ser ripado para poente e a sua rasante elevada à superfície”, pois tal “acarretaria (…) um incremento brutal das afetações no património (habitações, espaços industriais e vias de comunicação), o que não parece crível e iria ao arrepio das recomendações da DIA”, a Declaração de Impacto Ambiental.

Porém, apesar desta salvaguarda, o porta-voz da associação disse que as empresas estão a ser abordadas, desde julho, pelas empresas Luso-Roux e RR Planning, mandatadas pelo consórcio AVAN Norte, dizendo que o traçado será à superfície.

Pelos deputados, Carlos Barbosa (Chega) questionou como é que o consórcio sabe que “a Proteção Civil não dará seguimento ao túnel para Santo Ovídio, quando, por outro lado, ainda falta a própria IP e a própria APA [Agência Portuguesa do Ambiente] fazerem a sua avaliação”.

Pelo PSD, Francisco Lopes disse que “parece uma coisa um bocadinho estranha” haver técnicos “a fazer questões ou a abordar entidades, pessoas ou empresas por causa de uma eventual alteração que a tutela desconhece, que não tem qualquer tipo de decisão”.

O deputado do PS Frederico Francisco defendeu que a estação de Gaia “faz sentido, e faz sentido em Santo Ovídio, porque não é só a estação de Gaia”, mas sim “a primeira estação na Área Metropolitana do Porto”, com ligação a “duas linhas do Metro do Porto, à linha Amarela e à linha Rubi”, servindo “não só Gaia, mas também toda a zona central e ocidental do Porto”.

Pela IL, Angélique da Teresa alertou que o “concurso até pode ser impugnado pelos restantes [construtores], porque, de repente, vêm-se confrontados com uma alteração do traçado que implicava um custo associado e que, eventualmente, agora por causa deste traçado se vai poupar algumas verbas”, rejeitando que “o TGV seja um aeroporto de Lisboa” e se esteja “50 anos a discutir o que quer que seja”.

Pelo Livre, Jorge Pinto referiu a “chantagem que está a ser feita sobre todos”, mostrando-se preocupado que “venha a aparecer daqui a um par de semanas ou daqui a um par de meses uma notícia de que esta é a decisão única possível, que este é o único caminho possível e então aí já nada é exequível”, apelidando a proposta alternativa do consórcio de “desotimização do que estava inicialmente a ser proposto”.

O deputado do PCP Alfredo Maia lembrou que o Governo respondeu ao PCP que “a proposta adjudicada prevê a localização da estação em Santo Ovídio”, mas também que “a localização definitiva da estação de Gaia e as características da nova travessia do Douro serão propostas pela concessionária, cabendo à IP a sua aprovação”, centrando a questão no “problema de fundo” do poder “das parcerias público-privadas e dos concessionários”.

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