Fórum Turno da Noite no Porto conclui que é preciso humanização e mais diálogo

A primeira edição do Fórum Turno da Noite decorreu no Maus Hábitos – Espaço de Intervenção Cultural.

Julho 3, 2025

O setor do turno da noite está em crise e é preciso “humanizar” e desenvolver diálogos entre empresários, programadores e músicos, conclui Daniel Pires, dos Maus Hábitos, espaço portuense onde terminou esta quarta-feira o 1.º Fórum Turno da Noite.

“Está realmente a haver uma crise imensa e tem que se humanizar novamente a noite. Tem que se tentar afastar os media digitais da vivência. Temos de criar um distanciamento entre o que é viver e a realidade a dançar ou viver a realidade para filmar para pôr num “storie” de um Tik Tok qualquer da vida. Isso é uma coisa que está a transformar a noite, porque as pessoas vão aparentemente divertir-se para “postar” num sítio qualquer. Temos que voltar a se verdadeiros”, declarou à Lusa Daniel Pires.

Para o empresário de um dos espaços icónicos da cidade do Porto de intervenção cultural onde se pode ouvir música, beber e comer, este evento veio mostrar aos agentes do setor que é essencial todos falarem presencialmente uns com os outros e “chamar para as mesas não setores individualizados, mas cruzar setores”.

“Temos que humanizar mais uma coisa que tem tendência a estar industrializada que é o servir, visto que estamos numa cidade que se vocaciona muito para o turismo”, afirma, defendendo que todo o setor tem de “vestir a camisola” de bem servir, mesmo que o turista venha só uma vez à cidade do Porto.

Para Daniel Pires, as soluções passam por diagnosticar patologias da cidade acima de tudo.

“A segurança não passa só pelo que se passa na rua, passa efetivamente pelo pessoal que nos está a servir a bebida. Ela tem de olhar para nós com um olhar de vontade de atender e até de tentar perceber que se calhar esta pessoa está um bocadinho angustiada, porque passou por alguém que lhe disse uma coisa que não devia ter dito. Portanto, isso são tudo formas de combater a insegurança”, sustentou.

Daniel Pires chama a atenção para a preparação do setor para novas comunidades na cidade, designadamente a comunidade do Bangladesh que são maioritariamente homens que deixaram as suas mulheres em casa e que querem beber um copo à noite e que é preciso estar preparado acolher essas pessoas.

Questionado sobre novas regras do regulamento da Movida do Porto, que entraram em vigor há uma semana, no dia 25, passando a ser proibida a venda de álcool para consumo na via pública entre as 21:00 e as 08:00 em toda a cidade do Porto, Daniel Pires disse que as “proibições vão sempre levar a que haja sempre muita vontade de contrariar”.

“É óbvio que eu percebo que a concorrência de rua é extremamente nefasta, porque nós pagamos impostos, e de repente qualquer pessoa vai a um Pingo Doce comprar cerveja até mais barata que nós e põe-se a vender às nossas porta e óbvio que isso é extremamente pernicioso para os negócios e para a economia da noite, isso está a potenciar uma economia paralela”, considera.

Por outro lado, alerta que essa economia paralela pode ser uma “economia de sobrevivência” que pode estar a salvar uma família.

Mário Carvalho, empresário da noite há 37 anos e dono do Café Lusitano, um espaço com 20 anos cidade do Porto, disse à Lusa que uma das conclusões que retira deste primeiro Fórum da Noite é que é importante “ouvir as opiniões de várias gerações que estão a trabalhar no turno da noite, quer seja dos empresários, ao empregado do bar ou DJ”.

“O que aconteceu na última década é que há oferta a mais. E oferta a mais quando atravessámos uma pandemia, que obrigou as pessoas e ensinou as pessoa a viver em casa, e a divertir-se em casa, a beber em casa, a conviver em casa, assim como a própria lei do tabaco empurrou as pessoas para a rua e aqui não se chega a uma conclusão. Ninguém tem a fórmula mágica”, considera.

A segurança das ruas é outra preocupação, porque “a perceção e insegurança afasta a clientela e há uma quebra evidente de todas as casas na Baixa, porque há muita gente que tem algum receio do percurso até ir à casa”, adiantou.

Uma das soluções que agradou a Mário Carvalho foi a criação de uma escola especial para formar o turno da noite.

“Eu acho que uma escola da noite seria bom até porque seria capaz de dissuadir muita gente de investir em vão. (…) Há muitos que perdem dinheiro e, neste momento, tenho quase a certeza que muitos dos negócios da noite estão com algumas dificuldades, principalmente depois dos encargos todos que têm para pagar da pandemia que recorreram a financiamentos e apoios que agora têm de ser pagos”, explica.

Maria Martins, chefe de gabinete da Movida da Câmara Municipal do Porto, adianta à Lusa que este tipo de evento como o Fórum da Noite “tem de ter uma continuidade na criação de mais eventos que põe as várias partes da economia da noite em contacto para que haja mais “comunicação fluida e aberta”.

“Percebemos claramente que as dores são partilhadas entre todos, independentemente se falamos de um agente cultural, um programador, um agente criativo, um agente económico. Todos sentem as mesmas mudanças, seja a mudança do perfil do público, seja o facto das pessoas sentirem cada vez menos parte de uma comunidade”, diz.

Lutz Leidrenking, ex-empresário da noite de Berlin (Alemanha) e a desenvolver um projeto que analisa as noites de várias cidades do mundo, como Tóquio (Japão), Nova Iorque (EUA), Copenhaga (Dinamarca), Medellín (Colômbia), participou no Fórum e disse à Lusa que é muito importante que os intervenientes na movida do Porto possam dialogar.

Defende que a segurança na noite também passa por ter vários perfis e idades de pessoas na noite como famílias, pessoas a jogar xadrez na rua, por exemplo.

Na sua opinião, é preciso encontrar equilíbrios entre os vários públicos que se devem sentir mais seguros, porque “ninguém gosta de estar sozinho à espera de um autocarro de noite”.

Lutz também defende que haja mais dados sobre o que existe na noite do Porto.

“Os dados devem ser mais do que apenas dados económicos”, porque isso não revela a informação global sobre a movida do Porto, acrescenta, referindo que devem ter espaços e recursos para poderem denunciar os problemas.

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