O novo Governo vai “precisar muito” de criar pontes, nomeadamente “junto da sociedade que está muito agastada”, afirmou Roque da Cunha.
O secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) espera que o novo ministro da Saúde conheça os problemas do setor, seja sensato, e tenha poder político junto do primeiro-ministro e do ministro das Finanças.
“Há muita insatisfação, há muita incompreensão, portanto, terá de ser alguém que tenha capacidade de decisão e que se rodeie de uma equipa que de alguma maneira possa ajudar nesta tarefa ciclópica que é tentar recuperar o Serviço Nacional de Saúde. Não vai ser fácil”, afirmou Jorge Roque da Cunha em entrevista à agência Lusa.
Para Roque da Cunha, que vai deixar a liderança do SIM no congresso do sindicato em 23 de março, o novo ministro da Saúde deve ser “uma pessoa sensata, que crie pontes”, e tenha poder junto do chefe do Governo e das Finanças para argumentar que “investir no Serviço Nacional de saúde hoje, não é uma despesa, mas sim um investimento” para poupar no futuro.
O novo Governo vai “precisar muito” de criar pontes, nomeadamente “junto da sociedade que está muito agastada”, afirmou.
“Houve muita insensibilidade em perceber que a sociedade civil tem muitas questões que não estão a ser respondidas de uma forma correta”, considerou, manifestando a “total disponibilidade” do SIM para dialogar.
“Somos um sindicato de acordos, como temos revelado nos últimos anos. Claro que em situações de denúncia também é nossa obrigação fazê-lo”, rematou.
Questionado sobre a reforma do SNS com o alargamento a todo o país das Unidades Locais de Saúde (ULS), afirmou ser “uma grande preocupação”.
“Desde logo, porque esta situação de instabilidade e de queda do Governo ocorreu exatamente num momento em que existe uma nova Direção Executiva (do Serviço Nacional de Saúde) com novos poderes (…) e, ao mesmo tempo, a criação de ULS em todo o país”, explicou.
Segundo Roque Cunha, a “forma precipitada” com que foi feita esta reforma, acabando com as administrações regionais de saúde e obrigando a alterações legislativas na estrutura organizativa do SNS, “está a criar a maior das perturbações”, nomeadamente nos departamentos de recursos humanos, “que na maior parte dos locais, têm uma atitude perfeitamente inqualificável”.
Considerou que a reforma poderia ter sido feita de “forma faseada”, com a criação de condições nos recursos humanos das ULS para evitar perturbações em áreas como compras.
Neste momento, exemplificou, “há um problema de disponibilização de vacinas junto dos centros de saúde”, porque foi mudada a entidade que tinha a responsabilidade de fazer essas compras e a situação “agora é mitigada e desenvolvida pelas várias instituições”.
Ressalvando que não compete ao sindicato “criar ainda maiores dificuldades”, disse que o SIM está “muito atento, alertando, esclarecendo, fazendo com que o Ministério da Saúde e as entidades possam ultrapassar os problemas”.
Questionado sobre a possibilidade de esta reforma ser repensada se Luís Montenegro for indigitado primeiro-ministro, afirmou que “dada a situação de emergência” que o país vive, isso iria causar “mais adiamentos, mais perturbação”.
“Por isso, espero sinceramente que o repensar seja mesmo repensar. Identificar as situações onde é preciso alterar, naturalmente, com cabeça, tronco e membros, mas não partir do princípio que está tudo errado”, vincou.
Lamentou ainda as dificuldades que o SNS, uma das maiores conquistas do 25 de Abril, atravessa no ano em que a “Revolução dos Cravos” assinala 50 anos.
“Desde a origem do Ministério da Saúde, que saiu em 1975 do Ministério da Segurança Social, que há um claro subfinanciamento do setor da saúde”, lamentou o médico e sindicalista
Por outro lado, defendeu que, relativamente a algumas matérias, faz sentido o SNS contratualizar com os setores privados e social de “uma forma regrada” e em situações de igualdade e não de desespero.
“Quando as situações estão a nível de desespero e de incapacidade de resposta e em situações graves, naturalmente que não é possível negociar nem prazos, nem pagamentos de uma forma adequada”, defendeu.
Roque da Cunha manifestou ainda o desejo que, perante “o acumular dos problemas” ao longo dos anos no SNS, “haja por parte do Governo e de todos os partidos no Parlamento uma verdadeira vontade de ultrapassar os problemas” e de não utilizar “a saúde como a arma de arremesso político, alimentando divisões e problemas”.